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luciana caetano

Primeira bailarina profissional negra em Goiás

Sobre

“A dança é para todos, é para quem gosta dessa arte. Na verdade, a arte que escolhe a gente. Barreiras vão existir sempre, por enquanto, a gente vai encontrar mais barreiras do que facilidades. Mas sempre vai ter alguém na sua frente que vai abrir essa porta. Então, a gente tem que se espelhar nessas pessoas e não perder o foco”.

(Luciana Caetano)

Portfólio
Galeria
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LUCIANA CAETANO

Primeira bailarina profissional negra de Goiás

A história da bailarina goiana Luciana Caetano é marcada por ineditismos. A coreógrafa, professora de dança e de pilates, é a primeira bailarina negra profissional de Goiás e também foi precursora em outras situações: foi a primeira a continuar dançando mesmo grávida e uma das poucas com mais de 50 anos que prossegue se apresentando. E, ainda, uma curiosidade histórica – ela nasceu e ainda mora na primeira casa construída no Setor Marista, em Goiânia, e quando era bem pequena, todo final de tarde, corria para dentro da casa pra ver uma boiada passando na rua da residência.

O nome “dança” provocou uma reação em Luciana pela primeira vez aos três anos de idade. Ela tinha ido com a mãe, Gercina dos Santos Caetano, ao centro de Goiânia e quando Gercina leu “academia de dança” em uma placa provocou uma birra na menina. Depois desse dia, a menina imitava todo mundo que via na televisão e dava muitos shows em casa. Nessa época, ela ganhou duas bolsas: de dança e de piano. Seus pais esperaram a filha crescer um pouco mais até que em 1975, aos seis anos, ela entrou para o mundo da dança na academia Elzi Nascimento – psicóloga, irmã do diretor Wolf Maya e amiga dos pais de Luciana.

UNIVERSO ELITIZADO

Somente em 1993, Luciana Caetano encontrou uma colega de profissão também negra em Goiás, era Cristiane Santos, diretora do Nômades Grupo de Dança. E quando viajava para apresentações em outros estados, ela também se deparava com representantes únicas nas companhias de dança.

Para ela, o seu “campo de trabalho é num lugar elitizado”, explicando que o ballet clássico, o jazz e a dança contemporânea nasceram dentro de academias de estudos. A coreógrafa afirma que sua chegada nesse espaço se deve a condições privilegiadas que teve, diferente da realidade da maioria da população negra. “Eu nasci no Setor Marista, moro aqui, tenho um pai artista plástico, meus pais têm ensino superior. Então isso já me difere de muita gente”, reflete, acrescentando que se sente na obrigação de defender o espaço de estar onde sempre esteve para ter representatividade. “Se alguém quiser chegar lá eu estarei lá para acolher e mostrar a verdade.”

Nos lugares por onde passou como professora de dança, Luciana incentivou a presença de dançarinos negros, com descontos nas mensalidades por exemplo, mas mesmo assim a participação era pequena. Como professora, ela viu meninas negras fazendo aula de dança a partir do início dos anos 90. “O mundo da dança só foi ter pessoas negras em um número maior, embora seja pequeno ainda, quando o Gustav Ritter começou a oferecer as aulas e, agora, com o Basileu França”, analisa a goianiense.  

Para Luciana, esse universo elitizado da dança é distante de crianças e adolescentes negros em vários aspectos, mas principalmente do afeto. “Eu tive uma aluna que, com meu olhar e a minha presença, eu tinha que romper a entrada dela, porque só com a chegada dela na academia, todos os olhares se dirigiam pra ela, com a mensagem: ‘o que ela veio fazer aqui?’”.

BAILARINA PROFISSIONAL

Transformar o dançar de forma amadora para profissional foi algo que aconteceu naturalmente para Luciana. Depois da primeira academia, ela foi para o Mvsika! – primeiro centro de estudos de arte no Centro-Oeste e famoso pelo ballet clássico – depois para o Energia, “a primeira academia que começou um movimento de um grupo profissional. A dança contemporânea nasce dentro do Energia”. Luciana se encantou pela modalidade em 1986, durante o primeiro festival de dança de Goiânia, quando viu uma dança que nunca tinha visto na vida. “O povo com capa de chuva, meio sem roupa, uma dança que os bailarinos rolavam no chão. Eu pensei ‘quero saber o que é isso, quero fazer esse negócio.” Na academia ela fez aulas de ballet clássico, jazz e contemporâneo e entrou para o Grupo Energia, aos 15 anos, a convite do coreógrafo Julson Henrique.  

 

Passado algum tempo da sua entrada no Energia, os bailarinos mais adultos, como Vera Bicalho e Durval Ibler, começaram a deixar o grupo. Era 1988, o nascimento da Quasar Cia de Dança – uma das principais representantes da dança produzida no Brasil, com espetáculos apresentados em palcos nacionais e internacionais. Um ano depois, em 1989, Luciana foi chamada por Vera Bicalho, diretora-geral da Quasar, fez o teste, passou e foi uma das bailarinas da companhia por mais de dez anos, do final de 1989 a 2000.              

 

Luciana levou sua dança para o Brasil e para o mundo, dançando em vários estados e em palcos nos Estados Unidos, Europa e América do Sul. A primeira apresentação internacional foi na Colômbia. Porém, voltando um pouco no tempo, ela relembra com carinho do primeiro lugar que dançou fora da sua cidade natal. Foi uma apresentação pela escola em um festival em Goiatuba. 

SUA PRÓPRIA CIA DE DANÇA

Em 1996, ainda na Quasar, Luciana Caetano fundou o Grupo Solo de Dança, depois de enxergar entre seus alunos vários talentos, dentre os quais cita Luciana Ribeiro, Rodrigo Cruz e Lavínia Bizzotto. Quando o Brasil fez 500 anos, a bailarina foi convidada para coreografar espetáculos para comemorar a data. Com essa turma de alunos ela já havia criado o "Preto no Preto” e, a partir do convite, produziu “Saúri-nhõre”, sobre os indígenas, e o “Terra Cruz”, da raça branca. Dez anos mais tarde, em 2006, já com o Solo consolidado profissionalmente, Luciana funda um novo grupo: o Grupo Contemporâneo de Dança, com alunos amadores, que se apresentou até 2018.

“Um dos espetáculos mais lindos que eu já fiz na minha vida foi com o Grupo Contemporâneo de Dança, o Cartas de Frida, baseado nas cartas de amor da Frida Kahlo”, diz admirada. Questionada por colegas sobre a estrutura investida para amadores, ela responde que quis mostrar ser “possível fazer coisas maravilhosas com quem não é profissional”. E foram três dias de apresentação com o teatro lotado, com pessoas ficando do lado de fora pois não havia mais ingresso.

Sob seu olhar e direcionamento artístico, a bailarina, professora de dança e coreógrafa viu vários alunos se tornarem bailarinos profissionais: Késsia Andalécio, Maria Fernanda Miranda, Alexandre Ferreira e Lázaro Tuim.

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PROFESSORA E COREÓGRAFA

Luciana é geógrafa por formação, ilustrou um livro de Geografia e, esporadicamente, dava algumas aulas de reforço. Apesar de não ter exercido profissionalmente sua graduação, afirma que usa o conhecimento da geografia pra tudo em sua vida.

Por 23 anos, até 2018, a coreógrafa foi a única professora de contemporâneo para adultos que nunca tinham dançado. Apesar de ter encerrado essa fase, confirma que vire e mexe está dando alguma aula para adultos. Já para crianças, ela continua até hoje, inclusive com aulas on-line durante a pandemia. Inclusive, a professora fez parte de um projeto social em Niquelândia, quando viajava semanalmente para dar aulas para crianças da cidade. “O movimento está sempre na minha vida. No ano passado, por exemplo, eu tive uma turma de senhoras que nunca dançaram, sequer um forró na vida. Então isso foi uma descoberta incrível pra elas.”

“Adobe” e “Nem a Morte nos Separa” são os últimos espetáculos estreados por Luciana Caetano, ambos em 2019. O primeiro é uma concepção e coreografia dela e o segundo de Lázaro Tuim. E mesmo durante a pandemia, ela subiu aos palcos para se apresentar para plateias virtuais. “2020 foi o ano que eu mais produzi videodança na minha vida. Fiz parte do Festival Up!, um evento nacional, e também da programação do Sesc Goiás, em novembro de 2020”, narra a bailarina, que confirma estar com saudade dos palcos, pois, apesar das experiências serem válidas, “é completamente diferente.”

APRESENTAÇÕES MARCANTES

Para Luciana, todos os espetáculos são especiais. Alguns, no entanto, marcaram momentos importantes da sua história. Quando seu filho Gabriel, hoje com 23 anos, falou a primeira vez ela estava em turnê em Maceió. “Era aniversário dele e, antes da apresentação, eu liguei de um orelhão – ainda tinha orelhão no país. E minha mãe disse ‘advinha quem vai falar com você’. Foi um dia que eu dancei para ele.” Outro episódio significativo foi o dia do nascimento do primeiro sobrinho. Luciana estava se apresentando na Alemanha. E, ainda, o espetáculo Adobe, que ela concebeu para comemorar seus 50 anos de idade.

 

Grávida de Gabriel, Luciana dançou na Quasar até o terceiro mês e, com o Grupo Solo, ela fez o espetáculo “Enquanto se Espera”, onde dançou até o quinto mês de gestação. Quatro meses depois de dar à luz, ela estava de volta aos palcos. “Eu queria amamentar o máximo e o Gabriel amamentou até os onze meses. E vários bebês do Nordeste também amamentaram, porque eu precisava doar o leite para poder conseguir dançar.”

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PRECONCEITO NOS ESPAÇOS

Pelas características da raça negra e do corpo forte conquistado com a dança contemporânea, Luciana disse que ninguém dizia que ela era uma bailarina. “Eu poderia ser uma assistente, uma camareira, menos bailarina. Acho que as meninas de agora não sofrem tanto para explicar isso. Ninguém vai perguntar pra elas, por exemplo, se elas são bailarina de axé, como aconteceu comigo que sou da época do ‘É o Tchan’.”

Apesar do lugar privilegiado onde nasceu, a bailarina também sofreu e sofre nos dias de hoje com o racismo estrutural. “Quando você nasce preto, independentemente de onde você está, por onde circula, vai ser a mesma coisa”, alerta. Como professora de dança, por vária vezes, chegavam mães com suas filhas procurando pela professora que era uma bailarina reconhecida. “Muitas vezes elas chegavam e eu estava limpando a sala antes da aula, pois tenho alergia à poeira. Quando eu lavava o rosto e falava ‘vamos começar’, a mãe se espantava e “é você a Luciana Caetano? A gente veio só experimentar’”, relata como uma das situações que corriqueiramente acontecem. 

 Atualmente, Luciana é instrutora de pilates, uma área onde também percebe prejulgamentos. “Até hoje, eu enfrento olhares assim ‘ué, a professora é ela?’ Porque imaginam que eu seja a faxineira do lugar ou qualquer outra coisa”, relata a goiana, para quem grande parte do preconceito tem relação com a história de Goiás. “Historicamente, nós somos o último Estado a ser descoberto e fomos o último lugar a acabar com a escravatura. Então a gente continua na mesma conversa de anos.”

Para as meninas negras que sonham em ser bailarinas, ela tem um importante recado: “A dança é para todos, é para quem gosta dessa arte. Na verdade, a arte que escolhe a gente. Barreiras vão existir sempre, por enquanto, a gente vai encontrar mais barreiras do que facilidades. Mas sempre vai ter alguém na sua frente que vai abrir essa porta. Então, a gente tem que se espelhar nessas pessoas e não perder o foco”.

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INSPIRAÇÕES PARA A DANÇA

A referência na dança para Luciana Caetano veio de dentro da própria casa, da sua família. Da mãe Gercina dos Santos Caetano, da avó materna Maria José, das tias paternas que ela chama pelo apelido, segundo ela, um costume comum nas famílias negras: Isabel, Osvalda, Condinha, Tivera. E todas elas estão retratadas no espetáculo “Adobe”.

E no quesito dança, os homens da família são exemplos para a bailarina. “Engraçado que, na família, quem sempre dançou mais foram os homens que conviveram comigo, meu pai (Evaristo Pedro Caetano) e meu tio”, relembrando que cresceu ouvindo samba, Música Popular Brasileira (MPB) e música clássica e dançando com eles nas festas.  

Indagada sobre “parar de dançar”, a resposta é segura. “Não existe esse pensamento, porque a dança você adequa ao seu corpo, ao que você pode fazer no momento. Tem companhia só de cadeirante no Brasil. Dançar é um campo muito amplo”, declara Luciana Caetano, que tem expandido seus prazeres. Além de dançar, ela tem desenhado, plantado o próprio alimento e cozinhado mais.

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