top of page
banner-hotsite-laureane8.png

Laureane

A importância do cuidado recíproco

Sobre

“Quando mulheres se conectam, de uma forma positiva, é possível viver uma vida que faça sentido. E é possível deslocar as estruturas opressivas.” 

(Laureane)

Portfólio
Galeria
35fb19f6-4123-474f-8c50-a176da64ae1d.jpe

LAUREANE MARÍLIA DE LIMA COSTA:  uma jovem mulher que nos ensina a importância do cuidado recíproco

Há 26 anos, nasceu em Rio Verde (GO), Laureane Marília de Lima Costa. Formada em Psicologia e mestranda em Educação. O que essa jovem mulher tem a ensinar? O cuidado sempre pode ser compartilhado e recíproco. Mas para compreender melhor o que isso representa, é preciso conhecer um pouco da sua trajetória até aqui.

O INÍCIO

Laureane é a filha mais velha do casal Sirlei e Divânio Costa. Ainda grávida, sua mãe percebeu que a bebê não mexia muito dentro da barriga e a percepção continuou logo no primeiro banho da filha. Como Laureane tem uma prima apenas dois anos mais velha, era perceptível a diferença no desenvolvimento motor das duas. Só aos seis meses, o pediatra confirmou a percepção que a mãe tinha desde a gestação. A confirmação do diagnóstico veio aos dois anos de idade: atrofia muscular espinhal (AME), uma doença genética e neurodegenerativa.

Com a validação da AME da filha, Sirlei teve que encarar o machismo de alguns médicos que a aconselhavam “não engravide de novo, porque você pode ter um filho pior do que a Laureane”. Para eles, era “como se fosse bem ruim ter uma criança com deficiência”, comenta a psicóloga. Os conselhos foram ignorados e sua irmã, Laura, nasceu quando Laureane estava para completar sete anos.

image (11).png

CUIDADO COMPARTILHADO 

O sentido de dividir o cuidado entrou na vida de Laureane bem cedo. A mãe Sirlei, com diploma de magistério e experiência na alfabetização de crianças e jovens, foi quem deu início à alfabetização de Laureane ainda em casa. E o pai Divânio sempre ajudou a mãe nas tarefas e cuidados com a filha.“Isso foi fundamental para minha formação e também para as possibilidades que eu tive. Infelizmente, quando vem o diagnóstico de uma criança com deficiência, o abandono parental tende a ser maior.”

Na vida de Laureane, o estudo sempre foi uma prioridade e essa vontade veio muito da sua mãe. “Podia faltar qualquer coisa, mas não faltavam materiais educativos para eu brincar.” Para garantir os estudos da filha, Sirlei matriculou Laureane em uma escola pública bem distante de onde moravam, pois era a única que aplicava a Política de Educação Inclusiva. Esse é um outro ponto que a psicóloga considera fundamental para sua história. “Eu nasci em um momento no qual as crianças com deficiência podiam ir para escola comum.” E a alfabetização precoce trouxe à Laureane prerrogativas ao iniciar sua vida escolar.

“Eu tinha a vantagem de trocar com meus colegas coisas que eu precisava e poder oferecer pra eles o que eu já sabia. Isso foi importante para estabelecer na escola uma relação de ajuda mútua e não uma relação de só eu receber alguma coisa.”

Já nessa época, Laureane começou a dialogar com o público sobre suas vivências e ter uma postura de colaboração. “Isso foi importante para estabelecer em mim a vontade de seguir a carreira docente”, acredita. Tanto no ensino fundamental e médio, quanto na faculdade, a própria jovem lutava pelas adaptações necessárias ao ambiente, especialmente as relacionadas à acessibilidade. A jovem relata que, apesar de ter estudado em uma universidade particular, as mudanças que ela reivindicou para que o espaço fosse mais acessível só ficaram prontas depois que ela já havia finalizado o curso.   

image (10).png
image (6).png

COMPROMISSO COLETIVO

Narrando sua trajetória, Laureane se apresenta como uma mulher forte e determinada, porém, sentimentos como medo, tristeza e raiva também estiveram presentes. E, para ela, a raiva foi fundamental. “Quando a gente sente raiva, de algum modo a gente consegue mobilizar recursos de organização e resistência”.

Na infância e adolescência, a jovem sempre contou com o apoio dos pais e, agora na fase adulta, a história de outras mulheres com deficiência e a organização coletiva desse grupo a encorajam e também geram um sentimento de responsabilidade. “Permanecer em espaços, por mais difícil que seja alguma experiência, me indica que não é mais uma coisa relacionada só a mim, é algo que diz respeito ao grupo, ao coletivo. Se minha mãe pode me matricular numa escola é porque outras pessoas antes foram abrindo caminhos para que isso fosse possível. Então, faz parte, até por um compromisso coletivo, que eu continue daqui pra frente abrindo caminhos para que outras meninas possam se matricular, assim como aconteceu comigo.”

E ela fala com satisfação de conquistas que aconteceram após suas reivindicações. “Mesmo que eu não esteja desfrutando das mudanças que aconteceram na universidade, ver que outros estudantes agora têm um pouco mais de facilidade para se locomover naquele espaço, em função de uma reivindicação que eu contribuí para que acontecesse, é algo bem importante.”

 

CARREIRA

No início da carreira, por achar que as pessoas interpretariam sua fala apenas como uma experiência pessoal e não de uma forma profissional a partir dos seus estudos, Laureane tentou se esquivar do estudo da deficiência de forma acadêmica e se dedicou a outros tipos de opressão, como homofobia e sexismo. No entanto, a ausência de profissionais que abordavam deficiência e capacitismo* de forma séria e responsável mudou a direção do seu trabalho. *(Capacistismo é a discriminação e o preconceito social contra pessoas com alguma deficiência).

“Quando dei aula na universidade, eu percebia que muito do material reproduzia o capacitismo. E aí, nesse momento, eu não podia mais fugir da responsabilidade de desenvolver uma outra perspectiva junto com os alunos. De novo, não era mais algo sobre mim, apenas, era um compromisso de não deixar reproduzir uma opressão.” A partir desse engajamento profissional para falar sobre o tema, Laureane é hoje uma referência e atua na supervisão de casos de colegas psicólogos que atendem pessoas com deficiência e na formação de professores que trabalham com educação inclusiva e profissionais de saúde.

image (8).png

EXPERIÊNCIA COMO PROFESSORA

Durante dois anos, entre 2015 e 2016, Laureane estagiou como professora em uma escola de Rio Verde, período que ela recorda com muito carinho. O colégio, em uma região periférica da cidade, era referência com projetos socioeducativos em educação não sexista e questões de gênero. Ela relata que, no local, todas as tarefas eram divididas entre as crianças.

“Em um espaço onde todas as tarefas são divididas independente do gênero, a oferta e a recepção de ajuda se tornam algo muito mais natural. Então ali, como todo mundo se ajudava, ter uma professora cadeirante que precisava de ajuda, não era uma coisa sobrenatural para as crianças. Era tão comum que nem foi preciso um momento de adaptação das crianças comigo e de mim com elas.”

As crianças auxiliavam Laureane com tarefas do dia a dia, como alcançar a água, no café da manhã, pegar o material que seria usado na aula, e ela ajudava os alunos com a escuta atenta, com orientação de algum problema que eles vivenciavam e com a disponibilidade emocional. “É uma educação do fazer com a criança, com os adolescentes e não para ou por eles. E como toda equipe tinha uma formação nos estudos feministas, me relacionar com as colegas foi algo fácil, pois havia essa noção da responsabilidade compartilhada.”  

Já como professora universitária, a psicóloga vivenciou uma experiência diferente da anterior, e teve que lidar com o sentimento de preconceito por parte de professores e outros funcionários da universidade. Nessa época, sua irmã a auxiliava na locomoção e Laureane cita situações constrangedoras como, por exemplo, ao usar o elevador.

“Mesmo se eu estivesse com o crachá, mesmo se eu me apresentasse como professora, outros professores e funcionários da universidade acabam se dirigindo à minha irmã e não a mim. E ela é sete anos mais nova que eu.”

 

Ainda, algo bastante diferente foi em relação ao cuidado. “Na universidade, não há essa perspectiva do cuidado ser compartilhado. Se minha irmã estava me acompanhando, era como se me auxiliar fosse uma responsabilidade exclusiva dela.” Para ela, isso tem relação com o modo como a sociedade entende de quem deve ser responsável pelo cuidado.

 

SONHOS

A mestranda de apenas 26 anos ainda tem muitos sonhos para serem conquistados. O principal deles? Lecionar em uma universidade pública e poder orientar pesquisas de mestrado e doutorado. Antes disso, ela pretende continuar os estudos e ingressar no doutorado. E, também, sonha que sua pesquisa – uma articulação do campo da educação sexual emancipatória e dos estudos feministas da deficiência – possa produzir algum impacto positivo na vida de outras mulheres com deficiência. Laureane ainda é uma das organizadoras do guia “Mulheres com Deficiência: Garantia de Direitos para Exercício da Cidadania”.

image (5).png

MULHERES INSPIRADORAS

A mãe Sirlei e algumas professoras que ela conheceu ao longo da sua trajetória. Com carinho, ela recorda a “tia Cida”, uma professora do primário presente em sua vida até hoje, “uma mulher que foi muito importante na minha construção.”

A irmã também é uma referência para Laureane e com quem ela também vivencia a experiência do cuidado compartilhado. O nascimento de Laura, aliás, foi um momento marcante para Laureane. Ela nasceu prematura e a mãe precisou ficar em Goiânia e, por isso, foi a primeira vez que a menina se separou da mãe. Hoje a relação das duas é de muita proximidade, de responsabilidade de orientação da irmã mais velha com a mais nova e cuidado uma com a outra. “De novo, é uma relação de troca recíproca, e não só ela faz as coisas por mim. E, hoje, fico bem orgulhosa de ver que ela, ainda no início da faculdade, já participa de iniciação científica e à docência. Eu sei que parte do interesse dela veio de me acompanhar em várias atividades assim. A despeito das pessoas enxergarem muito mais o cuidado dela para comigo, porque é mais palpável, há também um cuidado de mim para com ela”, reflete Laureane.

E como mulher histórica, sua referência é Helen Keller, que nasceu no século XIX, ficou surdocega aos dois anos de idade e também teve uma mãe muito presente, que foi em busca de uma professora para ensinar a filha a se comunicar. “A Helen Keller não falou só de deficiência. Ela defendeu os direitos da classe trabalhadora, lutou pelo direito de voto para as mulheres. A história dela é marcada por um movimento de repressão das pessoas a partir do momento que ela deixa de ser a garota fofa que é exemplo de superação e começa a falar de temas políticos também importantes. A partir do momento que ela assume uma postura mais combativa, as pessoas começam a desmerecer o que ela fala, insinuando, inclusive, que o pensamento não era dela e sim da professora que a acompanhou”, descreve Laureane, afirmando que esse é um movimento que ainda hoje acontece com as mulheres, em geral, e com as mulheres com deficiência em particular.

Para encerrar, Laureane deixa uma mensagem de organização e resistência para as mulheres: “Quando mulheres se conectam, de uma forma positiva, é possível viver uma vida que faça sentido. E é possível deslocar as estruturas opressivas.”

 

ALGUNS FATOS

-No ensino fundamental, Laureane frequentou a única escola pública da cidade que aceitava crianças com deficiência;

-Na primeira escola onde estudou, Laureane era a única cadeirante;

-Na universidade, as mudanças relacionadas à acessibilidade só foram concluídas depois que Laureane já havia se formado;

-Uma das organizadoras do guia “Mulheres com Deficiência: Garantia de Direitos para Exercício da Cidadania”.

Representação
logo tjgo.png
  • Ícone do Instagram Cinza
  • Ícone do Facebook Cinza
  • Ícone do Youtube Cinza
bottom of page